Solidariedade com limites, por Beto Albuquerque

08/09/2021 (Atualizado em 08/09/2021 | 11:00)

Foto: Saul Teixeira
Foto: Saul Teixeira

Se há coisas no mundo que não devem ter limites, são o amor, a solidariedade e a empatia. Vimos neste momento difícil da pandemia isto transbordar em atitudes concretas. A sociedade se organizou e distribuiu bilhões de recursos aos que sofriam com o desemprego e a fome. A solidariedade é um caminho sem volta para um mundo que precisa se humanizar e reduzir desigualdades. Na saúde, a solidariedade e a empatia são fundamentais: doar sangue, plaquetas, órgãos, tecidos, e medula óssea são gestos que salvam muitas vidas.

Doze anos atrás, perdi meu filho Pietro, 19 anos, para uma leucemia mieloide aguda. Precisava fazer um transplante de medula e não conseguimos um doador compatível para realizá-lo. Ao invés de me recolher no luto eu fui a luta. À época, deputado federal, propus uma lei que criou a Semana Nacional de Mobilização para Doação de Medula Óssea, a lei Pietro.com.

Quando Pietro morreu, éramos apenas 850 mil doadores de medula no Brasil. Hoje somos mais de 5,5 milhões graças às pessoas que toparam se cadastrar nos hemocentros como doadores e medula.

Foi a multiplicação da solidariedade.

Um doador compatível com um paciente é quase um alfinete no palheiro, pode existir um a cada 100 mil pessoas cadastradas. Por isso, a luta é diária para cadastrar mais doadores. Fomos surpreendidos pelo Ministério da Saúde com uma decisão que limita a solidariedade e impede muitas pessoas de se cadastrarem como doadores.

Desde sempre, o Ministério da Saúde permitiu que se realizassem até 300 mil cadastros/ano no Brasil e que se poderiam cadastrar pessoas entre 18 e 55 anos. Agora, para a minha tristeza, só podemos cadastrar 149 mil doadores/ano e apenas doadores entre 18 e 35 anos. Ora, a partir de 36 anos não posso mais ser solidário? Por quê? Qualquer que seja a explicação não encontrará compreensão.

Aqui no RS, podíamos cadastrar até 21 mil pessoas/ano e agora apenas 6 mil. Temos cerca de 12,5 mil casos novos de leucemias/ano, 65% só podem sobreviver se encontrarem um doador compatível e realizar um transplante. Essa medida que restringe a solidariedade diminuirá logo ali na frente o número de doadores cadastrados e quem precisa de um doador terá mais dificuldades. A solidariedade não pode ter limite.


Autor: Beto Albuquerque
Vice-presidente de Relações institucionais do PSB, ex-deputado federal e presidente do Instituto Pietro

Fonte: Artigo originalmente publicado no jornal Zero Hora em 4.9.2021