As declarações do presidente Jair Bolsonaro (sem partido)
com críticas à China afetam a liberação de insumos pelas autoridades daquele
país e vão atrasar a produção de vacinas contra a Covid-19. O alerta foi dado
pela direção do Instituto Butantan nesta quinta-feira (6). A fala do chefe do
Executivo também foi criticada pelo governador de São Paulo, João Doria (PSDB).
Os comentários sobre a fala de Bolsonaro foram feitos
durante evento para liberação de lote de cerca de 1 milhão de doses da
CoronaVac. Segundo Doria, as afirmações de Bolsonaro geraram mal-estar na
diplomacia chinesa.
Bolsonaro ataca novamente a China
Em um novo ataque ao gigante asiático e principal fornecedor
de insumos para o combate à Covid-19, o presidente Jair Bolsonaro sugeriu na
quarta-feira (5) que o país asiático teria se beneficiado economicamente da
pandemia e afirmou que o coronavírus pode ter sido criado em laboratório. A
fala ecoa tese que não encontra respaldo em investigação da Organização Mundial
de Saúde (OMS) sobre as possíveis origens do vírus.
“Todas as declarações neste sentido têm repercussão. Nós já
tivemos um grande problema no começo do ano e estamos enfrentando de novo esse
problema”, disse Dimas Covas, diretor do Butantan.
“Embora a embaixada da China no Brasil venha dizendo que não
há esse tipo de problema, mas a nossa sensação de quem está na ponta é que
existe dificuldade, uma burocracia que está sendo mais lenta do que seria
habitual e com autorizações muito reduzidas e volumes. Então obviamente essas
declarações têm impacto e nós ficamos à mercê dessa situação”.
Dimas Covas, Instituto Butantan
O diretor do instituto diz que até dia 14 há compromisso de
entrega de vacina, de um lote que totaliza 5 milhões de doses, e que depois
disso não haverá mais matéria-prima para processar. “Pode faltar [insumos]?
Pode faltar. E aí nós temos que debitar isso principalmente ao nosso governo
federal que tem remado contra. Essa é a grande conclusão”, disse Covas.
Nova data para liberação de insumos
Covas explicou que a próxima liberação de insumos teve a
data de autorização adiada do dia 10 para o dia 13. O volume inicial seria de 6
mil litros, e agora a expectativa é de 2 mil litros. Para ele, as mudanças não
são na produção da Sinovac e sim determinadas pelas autorizações das
autoridades chinesas.
Ele acrescentou ainda que há várias informações mentirosas e
mirabolantes no discurso do presidente, citando que teria havido uma fabricação
do vírus. “A Organização Mundial de Saúde fez uma auditoria, podemos dizer
assim, e deixou muito claro quais as condições de surgimento desse vírus, esse
relatório foi disponibilizado para o mundo, não resta nenhuma dúvida. E outro
ponto, a China fez o que o Brasil não fez, a China controlou o vírus”.
Na quarta, Bolsonaro falou em guerra química. “É um vírus
novo, ninguém sabe se nasceu em laboratório ou por algum ser humano [que]
ingeriu um animal inadequado. Mas está aí. Os militares sabem que é guerra
química, bacteriológica e radiológica. Será que não estamos enfrentando uma
nova guerra?”, disse o presidente em evento no Palácio do Planalto, em
Brasília. “Qual o país que mais cresceu seu PIB? Não vou dizer para vocês.”
Doria critica falta de diplomacia do governo Bolsonaro
O governador João Doria fez críticas à falta de atuação na
diplomacia do governo brasileiro em relação à China.
“Diante de uma pandemia, o insumo da principal vacina que
vai no braço dos brasileiros vem da China, o mal-estar provocado por sucessivas
declarações desastrosas do ministro da Economia Paulo Guedes e agora do
presidente da República Jair Bolsona, e o Ministério das Relações Exteriores
silencia. Que Ministério das Relações Exteriores é esse que não faz relações
positivas, construtivas, com países, seja pela economia, seja pelo fato de que
a China é a principal provedora de insumos para as vacinas?”, questionou o
governador.
Questionado sobre o assunto, Doria afirmou que deve se
vacinar nesta sexta-feira (7). “Eu vou tomar a vacina amanhã. E por que vou
votar amanhã? Porque eu tenho que seguir 15 dias de diferença da data que tomei
a vacina contra a gripe e a data para a vacinação da Covid”, disse.
Parlamentares comentam polêmica
O líder da Oposição na Câmara, Alessandro Molon (PSB-RJ),
criticou a postura do presidente em relação à China e ao combate à pandemia.
“Para desviar a atenção dos escândalos revelados pela CPI da Covid, Bolsonaro
parece estar disposto a tudo, até mesmo prejudicar a vacinação”, escreveu.
O assuntou foi abordado durante reunião da Comissão
Parlamentar de Inquérito (CPI) da Pandemia, no Senado Federal, que ouve na
manhã desta quarta o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga. O senador Tasso
Jereissati (PSBD-CE) informou que vai apresentar um requerimento para convocar
o diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Alexandre Ramagem
Rodrigues, para prestar esclarecimentos sobre a fala do chefe do Executivo que
insinua uma guerra biológica.
Fonte: Socialismo Criativo com informações da Folha de S. Paulo