Artigo : O Novo Código Estadual do Meio Ambiente (RS)

19/08/2020 (Atualizado em 20/08/2020 | 10:48)

Em janeiro (9) deste ano assumimos um novo Código Ambiental (Lei nº 15.434/2020). A Lei revogou o antigo (Lei nº 11.520/2000) e uma série de outros dispositivos. Com isso, a nova legislação alterou substancialmente o direito ambiental gaúcho. Algumas alterações são bem vindas, outras nem tanto. Aliás, o grande temor naquele momento e não é diferente agora, que as mudanças no Código Estadual do Meio Ambiente tenham rompido barreiras de proteção, em nome do “desenvolvimento” e velocidade na aprovação das licenças ambientais.

Evidentemente, as mudanças aprovadas, sobretudo as de maior importância e/ou significado estão amarradas a um projeto de estímulo ao investimento privado, mesmo que com impactos severos sobre o meio ambiente. Modernizar o Código, fazer ajustes e adequações, como incluir elementos da legislação federal, é uma coisa. Mas, suprimir artigos relevantes, deixar a redação do texto confusa e aberta a interpretações variadas, é outra, bem diferente. Portanto, é um engano pensar que ganhar tempo e agilidade foram os únicos objetivos conquistados nas mudanças. Vai além. E debater sobre os impactos dessas iniciativas pouco interessa ao governo. Prova disso é a PEC 284/19, que visa alterar o Art. 259 da Constituição Estadual, permitindo a privatização de Unidades de Conservação sem qualquer consulta prévia ou mesmo ouvir o Conselho estadual do meio Ambiente.

As intenções ambientais do governo Eduardo Leite impressionam. Eu já deveria imaginar pelo pouco que fez ou nada fez pelo Meio Ambiente, enquanto prefeito de Pelotas. Ocupações irregulares e autorizadas em Áreas de Preservação Permanente dos ambientes de margem do arroio Pelotas, descaso absoluto com o saneamento básico, ausência de fiscalização e controle ambiental... E olha que tive a oportunidade de falar sobre parte dessas questões em uma apresentação que fiz em seu gabinete. E a política ambiental de quem veio depois, sua vice e atual prefeita, é muito pior e bem menos comprometida com as questões ambientais da cidade.

Voltando ao Código, um bom exemplo da confusão, nada necessária, é a redação dada ao conceito de licença ambiental. Era mais simples, direto e sem margem para dúvidas, quanto a ser um instrumento da política ambiental, decorrente do poder de polícia ambiental, de natureza autorizatória. A nova redação reduz o licenciamento a um ato administrativo do órgão ambiental. Outro exemplo está na redação do conceito de manejo ecológico. No novo código a recuperação do ambiente, ou seja, a ideia de correção dos danos verificados caiu. E a lista é enorme. Algumas inclusões têm sentido, mas outras confesso que me fogem o entendimento, incluindo a revogação de conceitos consolidados, como os que caracterizavam o ambiente de várzea, o que só empobreceu a natureza do texto. Também, a explicita definição de nova diretriz às ações de fiscalização, que devem priorizar a orientação, atenuando o caráter punitivo, de emissão imediata de multa, diante das infrações e/ou irregularidades. Com certeza, isso muda o sentimento de conforto, em relação ao rigor da Lei.

Entre as inclusões positivas destaco a materialização do Sistema Estadual de Informações Ambientas (SISEPRA); a inclusão do Pagamento pelos Serviços Ambientais entre os estímulos e incentivos, o que é positivo, mas de pouca viabilidade, pelo menos até que seja implementada a cobrança pelo uso dos recursos hídricos, entre outras disposições necessárias. O próprio Código Florestal (Lei 12.651/12) prevê incentivos para a recuperação de áreas degradadas, porém não passa de um texto legal, sem aplicação prática na vida das pessoas. Mas é nos detalhes que muitas vezes a verdadeira intenção passa desapercebida. Ao revogar o Art. 24, que tratava da proibição objetiva de acesso ao financiamento bancário (estadual) e fundos especiais de desenvolvimento empresas e órgão públicos cuja situação ambiental não estiver plenamente regularizada... o governo esqueceu que a Política Nacional do Meio Ambiente traz diretriz semelhante como punição ao infrator e obrigam as entidades e órgãos de financiamento e incentivos governamentais condicionarem a aprovação de crédito ao cumprimento das regras ambientais. 

De toda sorte, nenhuma mudança tem mais significado que alteração do rito do licenciamento ambiental. A Licença por Adesão e Compromisso (LAC) foi o grande trunfo político do governo para aprovação do Código, prometendo desburocratizar e agilizar o licenciamento ambiental no Estado. A LAC é largamente utilizada em outros estados brasileiros e o próprio STF já reconheceu competência legal dos estados para legislar nessa matéria. No entanto, autorizações autodeclaratórias, com posterior conferência, na ausência de um trabalho educativo, de construção e respeito às leis e princípios da conservação, pode representar confiança em excesso. Na prática, invertemos a lógica atual de “monitorar processo e não as licenças” para “licenciar rapidamente e monitorar a atividade”. Só o tempo para mostrar o quanto acertamos ou erramos.

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